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HELEIETH SAFFIOTI


"A discriminação contra a mulher e o negro no Brasil é socialmente construída para beneficiar quem controla o poder econômico e político. E o poder é macho e é branco."



terça-feira, 13 de setembro de 2011

INTELECTUAIS NEGRAS

RESENHA
HOOKS, Bell. Intelectuais negras. Dossiê mulheres negras. Estudos feministas. [Tradução de Marcos Santarrita]
Por GLAUCE SOUZA SANTOS
(Estudante de Letras - UESB/Jequié)

Bell Hooks[1] em seu texto Intelectuais Negras, discute sobre a importância do trabalho do intelectual, sobretudo os causadores da desvalorização das intelectuais negras e os seus dilemas.
Inicialmente ela afirma que numa sociedade fundamentalmente anti-intelectual, é difícil para os intelectuais comprometidos e preocupados com mudanças sociais radicais afirmar o impacto significativo dos seus trabalhos. Segundo ela, é esta desvalorização do trabalho intelectual que torna difícil para indivíduos que vem de grupos marginalizados considerarem este trabalho uma atividade útil.
Diante de uma infância perseguida Bell Hooks afirma ter valorizado o trabalho intelectual porque oferecia recursos para intensificar  a sobrevivência e o prazer de viver. A sua opção de se voltar para o trabalho intelectual está relacionado ao objetivo de sobreviver a uma infância dolorosa. A mesma acreditava que era a partir desta opção que ela entenderia a sua realidade e o mundo em volta. Sendo assim, afirma que nunca pensou no trabalho intelectual como de algum modo divorciado da política do cotidiano.
Ainda sobre a opção de tornar-se intelectual, Hooks dialoga com Cornel West que afirma “A opção de tornar-se um intelectual é um ato de auto-imposta marginalidade”. Segundo ela, na maioria dos casos esta opção pode remontar a uma raiz comum: uma experiência tipo conversão religiosa comum professor ou colega que o influencia.
Hooks acredita no trabalho intelectual como uma parte necessária da luta pela libertação. Porém, compreende que a subordinação sexista na vida intelectual negra continua a obscurecer e desvalorizar a obra das intelectuais. Neste sentido, não deixa de criticar a falta de discussão do impacto dos papéis sexuais e sexismo no ensaio O Dilema do Intelectual Negro – escrito por Cornel West. Segundo ela, o momento histórico em que foi escrito o ensaio favorecia esta discussão, pois, havia na época um enfoque feminista.
Segundo Bell Hooks, muito pouco se escreveu sobre intelectuais negras e quando a maioria dos negros pensa em grandes mentes, quase sempre vem a imagem de homens. Ela justifica essa invisibilidade afirmando que é ao mesmo tempo em função do racismo, do sexismo e da exploração de classe institucionalizados, e um reflexo da realidade de que grande número de negras não escolhem o trabalho intelectual como sua vocação.
Em seu texto, Hooks se baseia no ensaio Crítica, Ideologia e Ficção de Terry Eagleton, que apresenta o intelectual não apenas como alguém que lida somente com ideias, mas, alguém que lida com ideias transgredindo fronteiras discursivas; alguém que lida com ideias em sua vital relação com uma cultura política mais ampla.
Hooks pontua que a negação às mulheres a oportunidade de seguir uma vida da mente é atuação do patriarcado capitalista com supremacia branca. Por isso acredita que só através da resistência efetiva é possível exigir o direito de afirmar uma presença intelectual.
A autora também discorre sobre a construção dos estereótipos voltados ao corpo feminino negro, o que o categoriza em termos culturais, como bastante distante da vida mental. Outro dilema apresentado no texto é sobre a dificuldade de fazer do trabalho intelectual uma prioridade essencial, segundo a autora, é responsável por isso a socialização sexista inicial que ensina às negras que o trabalho mental tem de ser sempre secundário aos afazeres domésticos, ao cuidado dos filhos, ou a um monte de outras atividades servis.
Hooks pontua também a crítica feita por West em O Dilema do Intelectual Negro, sobre os modelos burgueses de vida intelectual que a concebem só em termos individualistas ou elitistas, e oferece como alternativa o modelo da “insurgência”. Ao confessar que grande parte do trabalho intelectual se realiza em isolamento, logo questiona como podem as negras enfrentar a escolha do isolamento necessário sem entrar no modelo burguês? Por isso apresenta a diferença que há entre o isolamento exercido pelo homens e pela mulher. Assim, ela afirma que para sentir que temos direito a um tempo solitário, as negras, devem romper com as ideias sexistas/racsitas sobre o papel da mulher e a descolonização da sua mente parece ser fundamental para se tornar uma intelectual.
Segundo Bell Hooks a política do patriarcado torna a situação dos intelectuais negros diferente da das negras, pois embora eles enfrentem o racismo, não enfrentam os preconceitos de gênero. Hooks ainda pontua o paradigma oferecido por West que permite uma ênfase em acabar com o sexismo e a opressão sexista como uma condição prévia para a insurgência intelectual do negro. Segundo ela, haverá maior estímulo para que as jovens estudantes escolham caminhos intelectuais quando comunidade negras diversas enfocarem os problemas de gênero e o trabalho de estudiosas for lido e discutido mais amplamente nesses lugares.
Hooks acredita que o trabalho intelectual pode nos ligar a um mundo fora da academia, aprofundar e enriquecer nosso senso de comunidade. E é essa ideia que ela afirma querer compartilhar com as jovens negras temerosas de que o trabalho intelectual nos aliene do mundo “real”.
Portanto, conclui orientando as intelectuais negras comprometidas com práticas insurgentes a reconhecer o apelo para falar abertamente sobre a vida intelectual e sobre o trabalho como forma de ativismo. Pois, segundo ela, quando o trabalho intelectual surge de uma preocupação com a mudança social e política radical, quando esse trabalho é dirigido para as necessidades das pessoas, nos põe numa solidariedade e comunidade maiores e enaltece fundamentalmente a vida.



[1] bell hooks é o pseudônimo de Gloria Jean Watkins, escritora norte-americana nascida em 25 de setembro de 1952, no Kentucky – EUA. O apelido que ela escolheu para assinar suas obras é uma homenagem aos sobrenomes da mãe e da avó. O seu texto é assinado com letra minúscula, opção da própria autora.

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